terça-feira, 7 de outubro de 2014

Poesia - Terezinha de Jesus

Terezinha de Jesus

A dar meia volta sobre o espaço
Recobro os tempos da infância
Quando eu era ainda bem criança
E saía brincar á tardinha
Momentos em que também vinha
A surgir num de repente
Aquela miniatura de gente
Apelidada unicamente Maria Chiquinha

Era bela e por demais atraente
E também graciosa aquela guriazinha
Com a delicadeza que tinha
Que por vezes até me contaminava
Junto comigo brincava
A originar-se mil fantasias.

Quando ninguém nos interferia
Naquela alusão toda minha
Lhe chamava de minha rainha
No velho instinto de macho
Com inocência acariciava os cachos
Dos sedosos cabelos da Maria Chiquinha.

Jamais percebíamos a distância entre nós
Seu pai, um rico e conceituado estancieiro
Eu, na realidade, filho de um pobre posteiro
Que ganhava por dia apenas 7 mil réis
Enquanto o patrão hospedava-se em luxuosos hotéis
Nós comíamos apenas feijão mexido com banha e farinha.

Pois era na realidade tudo, tudo o que se tinha
O que agradecíamos diariamente aos nossos pais
Porque o pouco com Deus já muito nos satisfaz
Mas quando a Chiquinha chegava feliz e contente
A sentar-se a meu lado para comer com a gente
Sem perceber minhas bombachinhas rasgada atrás.

A proferir minha narrativa
É recorrer igualmente a própria etimologia
É relembrar com regozijo aquela guria
De onde me faltam inovados argumentos
 Onde na vida, em mágicos momentos
Busca-se a verdade em inovadas ficções.

Em fadas, em sonhos e notórias razões
Buscando o destino que não se desdobra
Por mais que se insista em ocultas manobras
Deus concede a todos nós o direito de sonhar
Para tudo na vida existe o seu lugar
Onde sempre realidades se estampam com sobras.

O laço do tempo desenrodilhou-se tão rapidamente
Foram oito, dez, doze anos talvez
Quando no entanto  chegou sua vez
A interpelar-me com certa desconfiança
A insinuar que já não era mais criança
Que eu deveria chamá-la pelo nome correto.

Em que foi batizada e registrada por certo
Em uma determinada presunção a que se deduz
E uma certa arrogância a que me conduz
Sem discrepância, diferença ou egoísmo
Comecei a chamá-la no entanto pelo nome de batismo
O que seria excepcionalmente Terezinha de Jesus.

No mistério mais profundo em que a vida nos envolve
Tudo se resolve como a natureza requer
Aquela guriazinha aos poucos tornou-se mulher
Com seios bonitos, cintura fininha
Mas pra mim continuou sempre a mesma Chiquinha
A criar em minha mente milhões de fantasias.

Em tê-la em meus braços pra sempre um dia
Onde a fé que nos move jamais se reduz
Em sólidas razões para que me propus
Em fantasiá-la ao meu lado feliz e tão bela
Com véu e grinalda adentrar a capela
Da Virgem Maria Senhora da Luz.

Mas o tempo gaudério galopou tão depressa
Onde me fiz ao relento rude domador
Na arte de tranças tornei-me doutor
Trabalhando com afinco, perfeição e esmero
Aprimorando rédeas, laços e aperos
Na respeitabilidade mais prepotente de um homem.

Onde a afabilidade na humildade se consome
Derrubei no caminho minha própria identidade
Sem perder, no entanto a virtual dignidade
A constatar um dia Maria Chiquinha
Que eu sempre sonhei ser a minha eterna rainha
Preconceituosamente me chamar de guasqueiro

Rasqueteei meu malacara, joguei em riba o bacheiro
Coloquei o arreio, pelegos e me bandeei pra cidade
Em busca da dita e sonhada sociedade
Que seria o nosso centro de tradições
Onde entrei sem fazer menores alusões
Guardei meu chapéu, tirador, minha mala.

Convidei a primeira prenda e fui para a sala
Dançando uma vaneira em grande estilo
Entretanto escutei uma voz que dizia: - O que é aquilo?
Será que este pobre peão não conhece o seu lugar?
Ou mesmo ainda não deixou de ser vulgar?
Enxuguei então minhas lágrimas com o próprio pala.

Este rapaz é o guasqueiro do papai
Foram palavras que ressoaram em minha mente
Que até hoje as ouço frequentemente
Onde procurei assimilar com grande calma
Mesmo ferindo minha imperecível alma
Quando meus dias passaram a ser tristonhos.

A Maria Chiquinha hoje só mesmo a vejo em sonhos
Aquela estância pra mim tornou-se apenas história
Os lindos trançados ainda vagam em minha memória
Meu tirador, minhas botas, minha mala
Minhas bombachas, chapéu e meu pala
São resquícios de um passado que ainda mais se distancia.

Em caladas da noite em frequentes calmarias
Ainda com frequência recordo a minha Maria
Hoje a ilusória Chiquinha suponho
A notável Terezinha dos meus sonhos.

Talvez sendo ela a brilhante estrela guria
Que nasce no horizonte radiante de luz
Mais a estrela dalva que a todas vigia
Talvez seja a mais radiante das três marias

A minha eternamente sonhada Terezinha de Jesus.

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